Este artigo resulta do cruzamento de três acontecimentos recentes na minha vida: o visionamento de um filme, a leitura de um livro e o falecimento prematuro e totalmente inesperado de um amigo de longa data.
Segundo um velho e conhecido ditado, tempo é dinheiro. Ora, isto parece traduzir uma igualdade entre tempo e dinheiro, o que é enganador. O tempo é muito mais valioso do que o dinheiro. Por várias razões. Desde logo, porque o stock de tempo de cada um de nós é limitado. Pior: é desconhecido. Eu não sei qual é o meu tempo de vida. Por outro lado, se eu tiver mais tempo posso ganhar mais dinheiro, mas o oposto não é exatamente verdadeiro. O facto de ter mais dinheiro pode dar-me alguma flexibilidade relativamente à forma como uso o meu tempo mas na verdade não me cria (mais) tempo (de vida). Não sendo possível criar tempo, apenas posso decidir como alocar aquele de que disponho – e que não sei quanto é. Ou seja, enquanto que o dinheiro pode ser renovado (desde que eu tenha tempo), o tempo não (mesmo que eu tenha dinheiro). Cada hora, cada minuto, cada segundo que passa, não volta. Eu posso pedir dinheiro emprestado e certamente haverá quem mo empreste, em menor ou maior quantidade, mais caro ou mais barato. Mas infelizmente não consigo que alguém me empreste tempo (para que eu aumente o meu stock).
Isto deveria ser suficiente para que cada um de nós usasse o tempo de que dispõe de forma extremamente sensata. Porém, não é isso que se constata. Arrisco a dizer: pelo contrário. É dolorosa a forma como algumas pessoas desperdiçam o seu tempo, abusando de procrastinação e cronófagos pessoais. Depois, temos a nossa (portuguesa) crónica e doentia falta de pontualidade (seria interessante tentar quantificar os seus custos globais). Mas o que mais custa é ver como o tempo de algumas pessoas é desperdiçado, contra a sua vontade e até o bem comum, devido a imposições de terceiros, com poder hierárquico sobre elas. Em certas profissões é realmente doloroso. Mas isso dava para outro artigo…
Recentremo-nos no tema de hoje: tempo e dinheiro. Custa a compreender como é que tanta gente trata o dinheiro com tanto cuidado (muitas vezes até de forma doentia, obsessiva) e o tempo de forma tão negligente. É para mim incompreensível como é que tantas pessoas abdicam de tempo para ganhar mais dinheiro. Não me refiro àquelas que, infelizmente, precisam absolutamente de o fazer – necessitam de abdicar de muito tempo para, em troca, obter pouco dinheiro. Refiro-me àquelas que, não necessitando na verdade de mais dinheiro, continuam, patologicamente, a dar mais valor ao dinheiro do que ao tempo. Algumas nunca terão tempo para usufruir desse dinheiro. Talvez não lhes sobre tempo sequer para pensar que de um momento para o outro podem ficar sem tempo – logo, sem dinheiro.
Infelizmente, o mundo é maioritariamente governado pela ganância. Associada ao dinheiro, entenda-se. No fundo, não foi ela que desencadeou esta enorme crise à escala planetária? Um pequeno número de pessoas fez mau uso do seu tempo e estragou o stock de tempo disponível (a vida) de muitos milhões de pessoas, em muitos casos, de forma definitiva e irremediável. Como o mundo seria melhor se cada um de nós pudesse alocar uma pequena parte do seu tempo, ajudando outros a troco de nada, apenas pela satisfação de o fazer!...
Nota: na origem deste artigo estiveram, de alguma forma, o filme “In Time” de Andrew Niccol (2011; título em Portugal: “Sem tempo”), o livro “Time Value of Life”, de Tisa L. Silver (2011; não traduzido para Português) e o inesperado falecimento recente do meu amigo António, à data Presidente da Direção da Associação de Antigos Alunos do Departamento de Gestão da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Viseu, cuja memória evoco.
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