quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

A propósito de Iliteracia contabilística

Mais um ano chega ao fim! Mais um ciclo contabilístico que se fecha e outro que recomeça. Há que preparar 2012.

A contabilidade tem uma linguagem própria que todos devemos perceber. O registo do dia-a-dia de qualquer negócio é exigido por lei e, além disso, é útil enquanto importante instrumento de gestão. A manutenção de registos atualizados é vital para a operacionalidade diária de qualquer entidade, seja qual for o ramo de negócio. A informação sobre a situação financeira da entidade irá ajudar a identificar e corrigir quaisquer problemas entre receitas e despesas antes que estes se tornem em catástrofes. Estes registos devem ser mantidos para determinar, entre outras, as responsabilidades fiscais do indivíduo ou negócio. Independentemente do tipo de sistema contabilístico utilizado, os registos devem ser permanentes, precisos e completos, e devem especificar claramente as receitas, despesas, créditos, débitos e demais informações especificadas através do sistema legal vigente: fiscal, comercial, laboral, da concorrência, ambiental e demais legislação sectorial. Devemos ter presente que a implementação do sistema contabilístico é da responsabilidade do órgão de gestão.

A gestão moderna de qualquer entidade não se limita a recordar o passado e a conhecer o presente. É necessário perspetivar o futuro, planear a atividade, estabelecer objetivos, mediante uma prévia seleção entre as diversas alternativas possíveis. Ora, para o estabelecimento destas opções é necessário conhecer os elementos que as fundamentam. Os dados da contabilidade constituem um importante auxiliar no fornecimento desses elementos.

A Contabilidade é vista como uma técnica de registo e de representação de todas as transformações sofridas pelo património de qualquer entidade económica durante o exercício da sua atividade, de modo a saber-se, em qualquer momento, a sua composição e valor, fornecendo, simultaneamente, informações para a tomada de decisão de gestão - registo histórico dos factos patrimoniais.

A Contabilidade é vista como uma ciência que seguindo uma técnica definida e própria, permite, a cada momento, avaliar e quantificar o património, valorizando e prevendo as suas variações e os fluxos por elas gerados, com vista à otimização da gestão - previsão do futuro, facto relevante da gestão moderna.

As informações prestadas pela contabilidade ultrapassam, em larga escala, o âmbito da entidade e dos seus mais diretos colaboradores, revestindo interesse para um vasto conjunto de utilizadores (gestores, investidores, credores, financiadores, Administração Fiscal, estatísticas nacionais e sectoriais, etc.).

De um simples processo de registo de transações, a contabilidade foi-se transformando progressivamente numa fonte de informações, na medida em que pode facultar, a qualquer momento, o conhecimento da situação da entidade e o andamento dos negócios - técnica de gestão que tem como finalidade a determinação da situação patrimonial e dos seus resultados.

É preciso ir mais além. Não ver a contabilidade como a burocracia necessária para o cumprimento da legalidade, mas vê-la e como um instrumento de gestão do negócio, envolvendo todo o pessoal nos processos e sistemas a fim de aumentar a eficiência e aprofundar conhecimentos, colmatando eventuais lacunas, minimizando os riscos.

Estamos na era da informação! A tão propagada melhoria contínua só é possível quando a tomada de decisão do órgão de gestão é baseada em informação atempada, útil e adequada, tendente à obtenção de ganhos de eficiência, eficácia e economia, a fim de garantir uma produtividade sustentável.

Isabel Martins

Docente de Contabilidade e Auditoria na ESTGV

domingo, 9 de outubro de 2011

Depósitos de taxa crescente

Dadas as atuais dificuldades dos bancos portugueses em obter financiamento externo, estes viram-se cada vez mais para a captação de poupanças dos aforradores portugueses, publicitando, de entre outros produtos financeiros, depósitos de taxa crescente. Contudo, não se deixe iludir pela publicidade…
O que são os depósitos de taxa crescente?
Como alternativa aos “tradicionais” depósitos a prazo (que apresentam uma taxa de juro garantida para a totalidade do prazo, com prazos que habitualmente vão de 1 mês a 3, 6 e 12 meses), nos últimos tempos os bancos têm apresentado produtos de taxa crescente (ou seja, a taxa de juro aplicada ao produto aumenta com o decorrer do prazo), normalmente de médio prazo (entre 1 a 5 anos). Se bem que estes produtos de taxa crescente também possam assumir a forma de obrigações ou de fundos especiais de investimento, os mais comuns são os depósitos a prazo.
Porquê estar alerta?
Normalmente, na publicidade deste tipo de depósitos, é destacada exatamente a palavra “crescente”, com o intuito de fazer ver aos aforradores que a taxa de juro do depósito cresce ao longo do prazo. É também dado grande destaque à taxa de juro que vigora no último período do prazo do depósito (normalmente, a taxa mais elevada). Todavia, o investidor deverá saber que apenas terá direito a usufruir dessa taxa de juro se mantiver o montante aplicado no depósito até esse mesmo período. Além disso, a análise da rendibilidade deste tipo de depósitos deverá ter também em conta as taxas de juro que vigoram nos períodos anteriores.
O que fazer perante um produto financeiro deste tipo?
O melhor será recolher toda a informação relevante sobre o produto em relação a critérios como sejam a rendibilidade, o risco e a respetiva liquidez. Para isso, antes de subscrevermos um produto deste tipo, deveremos consultar a sua Ficha de Informação Normalizada (FIN).
Como podemos ter acesso à FIN?
De acordo com o Aviso do Banco de Portugal nº4/2009, antes da abertura de conta de depósito à ordem ou da celebração de outros contratos de depósito, as instituições de crédito deverão disponibilizar aos clientes a respetiva FIN. Inclusive, quando as instituições de crédito divulgam depósitos no seu sítio da Internet, deverão igualmente disponibilizar as respetivas FIN em local bem visível e de acesso direto a partir das páginas em que esses depósitos são divulgados.
O que deve constar numa FIN?
No caso de uma FIN para depósitos simples, não à ordem (onde se incluem os depósitos a prazo de taxa crescente), de entre outras informações, deverão constar: as condições de mobilização antecipada dos fundos, a indicação da possibilidade ou não de renovação do produto no seu vencimento, os montantes máximos e/ou mínimos de constituição e manutenção do depósito, a possibilidade ou obrigatoriedade da realização de reforços (entregas adicionais) e respetivas condições, a indicação da Taxa Anual Nominal Bruta (TANB), da Taxa Anual Nominal Líquida (TANL) e das TANB e das TANL médias quando ocorrem duas ou mais taxas de juro ao longo do prazo do depósito (caso dos depósitos de taxa crescente), a Taxa Anual Efetiva Líquida (TAEL) quando exista capitalização dos juros e a referência à aplicação do Fundo de Garantia de Depósitos.
Serão os depósitos de taxa crescente uma boa opção de investimento?
Naturalmente que a resposta depende do depósito específico que estivermos a falar e, além disso, depende do perfil do próprio investidor, nomeadamente da forma como este se posiciona perante os critérios de rendibilidade, risco e liquidez. Todavia, tratando-se de uma aplicação a médio/longo prazo, será sempre aconselhável analisar a rendibilidade de produtos como as Obrigações do Tesouro ou os Certificados do Tesouro.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

O “Outsourcing” é vantajoso para as pme’s.

Vivemos numa era em que o desenvolvimento técnico e científico e correspondente especialização tornam muito difícil senão impossível, a qualquer organização, dispor de todo o know-how de que necessita para se desenvolver, nas diferentes áreas de operação:
1. Muitas vezes existem picos de procura que, a serem assegurados somente por recursos internos à organização, conduzem à criação de uma estrutura que a prazo poderá não ser sustentável, em termos económicos e financeiros, tornando-se ineficiente;
2. Os recursos financeiros necessários à criação e desenvolvimento de qualquer actividade são, por natureza, escassos e, consequentemente, poderão não chegar para assegurarem todas as actividades.
3. Mesmo que os recursos financeiros existam, muitas vezes os custos associados a essa possibilidade, sejam custos operacionais sejam custos de investimento, praticamente desaconselham as organizações a dominarem todos os saberes e técnicas envolvidas nos seus negócios.
A alternativa é, portanto, procurar fora parceiros que possam, de um modo mais eficiente, realizar parte das operações do seu ciclo de actividades (nomeadamente aquelas que não fazem parte do know-how do negócio), possibilitando a concentração nas operações essenciais ao negócio.
É neste perspectiva que o termo “Outsourcing” passou a fazer parte do vocabulário de gestão e a ser praticado cada vez com mais interesse pelas organizações.
A ideia de “outsourcing” é a de que a empresa ao realizar fora as actividades em que têm menos know-how, que não têm capacidade (dimensão) para as realizar ou que não fazem parte daquilo que se costuma designar como o “core business”, desde que devidamente controladas e coordenadas, alavancam o próprio negócio.
Mais do que uma relação comprador-fornecedor, trata-se de uma relação traduzida em parceria/dependência e interesse mútuo no negócio (resultados/risco), salvaguardado naturalmente pela independência das entidades envolvidas.
Especialmente em Portugal, esta ideia de “outsourcing” avançou mais decisivamente há umas décadas e teve como pioneiras as actividades ligadas à informática, no início do seu desenvolvimento, quando as empresas por falta de know-how, investimento associado e/ou grau de especialização, passaram a realizar fora serviços de processamento de dados (service-bureau) ou mesmo o desenvolvimento de pacotes de software à medida.
Daí à situação actual em que, por exemplo na industria têxtil é prática deter a concepção de produto e contratualizar fora a grande maioria das operações a jusante, de facto, não passaram mais de 50 anos, período em que a ideia se consolidou fazendo, hoje em dia, parte da estratégia da maioria das organizações.
O cuidado fundamental nesta prática do “outsourcing”, está na selecção (qualidade da prestação) e coordenação com os “outsourcers” seleccionados para serem parceiros da organização: Na selecção pois há que assegurar os parâmetros de qualidade exigidos pelos clientes; Na coordenação do processo pois há que permanentemente avaliar os benefícios para ambas as partes. Só assim o processo é sustentável.
Sendo o tecido empresarial português representado em larga maioria por pme’s, o “outsourcing” apresenta-se como uma possibilidade prática de ganhar especialização e escala que lhes possibilite enfrentar mercados de maior dimensão e cada vez mais competitivos.
Carlos Rua
2011-09-06

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Há que aproveitar a onda!

Como prometido, hoje reflectimos sobre a utilidade da informação proporcionada pela Contabilidade ao órgão de gestão relativa às operações do dia-a-dia.

Nos tempos que correm, quem tem informação atempada, útil e relevante, tem vantagem competitiva sobre os restantes. Hoje, há condições excepcionais para que patrões e empregados rumem para o mesmo sítio – o sucesso da empresa. Os primeiros pretendem que a sua empresa tenha sucesso, nestes tempos que são difíceis, não fechando a porta, e os segundos pretendem assegurar o seu posto de trabalho, não cair numa situação de desemprego.

Há que aproveitar esta onda e ‘surfar’ para o sucesso!

Como? É imprescindível conhecer e analisar a informação contabilística da empresa. Neste ponto, mesmo não possuindo conhecimentos técnicos, o Técnico Oficial de Contas (TOC) tem o dever os facultar (obrigação que advém do seu órgão regulador, por via do Estatuto dos TOC), desmistificando mapas e números. Tal como na gestão das contas familiares, há que conhecer a situação actual, a evolução do passado e, com base nessa análise, projectar o futuro. Só temos de saber as operações aritméticas básicas: somar, subtrair, multiplicar e dividir.

Na posse dessa informação, detalhada e útil, o órgão de gestão está em condições de tomar decisões, sem que previamente tenha ‘escutado’ quem está no terreno, os seus trabalhadores. Não é necessário começar do zero, isto é, reorganizar ignorando o passado. O que é necessário é mudar comportamentos, de uns e outros, e todos contribuírem para o bem comum. Parece uma das ‘frases feitas’ que se vão lendo por aí, não é? Pois, mas é mesmo assim. Em relação a cada tarefa do dia-a-dia, por mais insignificante que pareça, questionar: como pode ser realizada mais eficientemente (fazer mais com menos!)? Sabemos que basta uma pequena poupança numa tarefa repetitiva (um ‘papel’ que deixa de circular, substituído por outro em meios informáticos, repetição, em todo ou em parte, de uma tarefa …) para a empresa ‘ganhe’, eliminando desperdícios. A palavra de ordem deve ser a co-responsabilização nas soluções dos problemas.

Há empresas (geralmente grandes empresas) que promovem ‘concursos de ideias’ entre os seus empregados, premiando as melhores e as piores ideias – estas últimas, por mais disparatadas que pareçam, são geradoras de ‘novas ideias’.

Há condições únicas para a mudança de comportamentos. Há que aproveitar a onda!

Isabel Martins

Docente de Contabilidade e Auditoria na ESTGV

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Plano Nacional de Formação Financeira: finalmente!...

Foi recentemente (finalmente!...) apresentado o Plano Nacional de Formação Financeira (PNFF) (1). Elaborado por representantes dos três reguladores financeiros portugueses - Banco de Portugal, Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e Instituto de Seguros de Portugal - tem um horizonte temporal de 5 anos (2011-2015) e como principais objetivos os seguintes: melhorar conhecimentos e atitudes financeiras, apoiar a inclusão financeira, desenvolver hábitos de poupança, promover o recurso responsável ao crédito, criar hábitos de precaução. Foram definidos cinco grandes grupos de destinatários desta formação, bem como os respetivos conteúdos e formas de divulgação, como se sintetiza a seguir:

Estudantes do ensino básico e secundário
Conteúdos:
- Importância do dinheiro e da poupança
- Meios de pagamento
- Acesso ao crédito
- Cartões bancários
Formas de divulgação:
- Disciplina autónoma ou em disciplinas pré-existentes
- Atividades extracurriculares

Estudantes universitários (2)
Conteúdos:
- Características dos produtos financeiros
- Relação rentabilidade/risco
- Funcionamento dos mercados financeiros
- Investimento em produtos financeiros complexos
- Acesso ao crédito
- Cartões bancários
- Risco de sobreendividamento
Formas de divulgação:
- Conferências/seminários
- Introdução de conteúdos de formação financeira em disciplinas dos cursos, quando for adequado às licenciaturas em causa

Trabalhadores
Conteúdos:
- Poupança
- Acesso ao crédito e suas diferentes modalidades
- Prevenção do sobreendividamento
- Seguros
- Preparação da reforma
Formas de divulgação:
- Conferências/seminários nos próprios locais de trabalho

Grupos vulneráveis (3)
Conteúdos:
- Acesso a produtos bancários
- Gestão do orçamento familiar
- Prevenção do sobreendividamento
- Prevenção da fraude
- Conteúdos de formação financeira em cursos de formação profissional, incluindo as ações dirigidas aos beneficiários do subsídio de desemprego
Formas de divulgação:
- Divulgação de conteúdos na televisão e em jornais

População em geral
Conteúdos:
- Características dos produtos financeiros de uso mais generalizado
- Tópicos específicos em função de etapas específicas da vida (crédito para compra de casa, preparação para a reforma, …)
Formas de divulgação:
- Spots de televisão e rádio
- Imprensa escrita
- Anúncios nas páginas eletrónicas de jornais

Notas:
1. O PNFF (documento integral) pode ser obtido a partir do endereço http://clientebancario.bportugal.pt.
2. Designação adotada pelo grupo de trabalho. Parece-me que teria sido mais correto adotar a designação “Estudantes do ensino superior”.
3. Inclui, nomeadamente, desempregados, imigrantes, reformados com baixos níveis de rendimento e jovens sem escolaridade obrigatória.

Genericamente, as medidas propostas vêm ao encontro do que há muito venho defendendo. Penso, pois, que se trata de um plano muito interessante e aguardo ansiosamente pela sua concretização. Requer a formação de muitos formadores e a produção de muito material de apoio. E cinco anos passam depressa... Um aspeto com que discordo frontalmente prende-se com a proposta de que para os estudantes universitários (entenda-se, do ensino superior) a implementação da formação financeira deve envolver “(…) a introdução de conteúdos de formação financeira em disciplinas dos cursos, quando for adequado às licenciaturas em causa” (nas áreas da Gestão/Economia, suponho). Considero, ao contrário, que é ainda mais importante que esses conteúdos sejam ministrados a estudantes de licenciaturas não diretamente ligadas a estas áreas.

(Texto escrito conforme o Novo Acordo Ortográfico, convertido pelo Lince, disponível no Portal da Língua Portuguesa).

sábado, 28 de maio de 2011

Será que vão aumentar o spread do meu crédito?

Com certeza que a maior parte de nós já teve conhecimento da “polémica” em relação à possibilidade dos bancos poderem alterar unilateralmente a taxa de juro ou outros encargos de um contrato de crédito. Tentemos esclarecer um pouco essa questão…
Quais as razões desta “polémica”?
As razões desta “polémica” prendem-se essencialmente com a possibilidade dos bancos, nos contratos de crédito à habitação e nos contratos de crédito ao consumo, poderem fazer incluir cláusulas que permitam alterar a taxa de juro por via do aumento unilateral (isto é, por exclusiva vontade do banco e não fruto da negociação com o cliente bancário) do spread.
Será que essa prática por parte dos bancos é legal?
De acordo com o Decreto-lei nº 446/85, de 25 de Outubro (alínea c), do nº1 e nº 2 do artigo 22º) os bancos poderão de facto incluir nos contratos de crédito cláusulas desse tipo, desde que estas integrem factos que consubstanciem “razão atendível” ou que correspondam a “variações de mercado”.
Será que os bancos não poderão utilizar abusivamente esta normativa em seu benefício?
Exactamente para evitar essa situação, o Banco de Portugal emitiu a Carta-circular nº 32/2011/DSC, de 17 de Maio deste ano. Deste documento podemos destacar os seguintes aspectos: os factos que consubstanciam “razão atendível” ou que correspondam a “variações de mercado” deverão ser concretizados com detalhe suficiente; tais factos deverão ser externos ou alheios ao banco, relevantes e excepcionais (será o caso, por exemplo, da descida do rating do banco para uma notação correspondente a um nível especulativo – junk); deverá ser estabelecido um prazo razoável para que o consumidor possa exercer o seu direito de resolução do contrato de crédito (não inferior a 90 dias) e indicado o momento a partir do qual as alterações produzem efeitos; e deverá também estar prevista a reversão das alterações quando os factos que as justificaram deixem de se verificar.
O que poderá fazer o cidadão comum?
Qualquer cidadão que possua um crédito (sobretudo se contraído recentemente) deverá analisar atentamente o contrato de crédito no sentido de detectar a existência deste tipo de cláusulas. Em caso afirmativo, deverá manter-se atento à evolução do valor da prestação do crédito (note-se que os bancos são obrigados a comunicar por escrito a activação destas cláusulas). No caso de se sentir lesado, contacte o seu banco pedindo explicações sobre a situação em causa, podendo também fazer uma reclamação no portal do cliente bancário (http://clientebancario.bportugal.pt), da responsabilidade do Banco de Portugal. Quem estiver a pensar contrair crédito num futuro próximo, antes de assinar o contrato de crédito, deverá verificar a eventual existência deste tipo de cláusulas no contrato e, em caso afirmativo, tentar negociar com o banco a sua exclusão.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Porque não, ainda que transitoriamente, aumentar as horas de trabalho?

Recentemente tem-se falado bastante sobre a competitividade das empresas e da necessidade de a aumentar.
Este aspecto é ainda mais significativo quando, consensualmente, se assume que a temática da exportação de bens ou serviços se afigura como determinante ao sucesso das políticas económicas futuras.
Ora a competitividade não é mais do que a capacidade de uma empresa ver privilegiados, pelo mercado, os seus produtos face aos da concorrência, assegurando, de um modo continuado, a sua sustentabilidade.
Se a competitividade aumenta por via da gestão, do investimento, particularmente em inovação, etc. também melhora através da melhoria da eficiência na utilização dos recursos aplicados.
Ora mais trabalho também reduz o seu custo unitário e ajuda a tornar mais competitiva a mão-de-obra sem que se tenha que reduzir salários, reduzir contribuições e outras prestações que oneram e inflacionam o custo da mão-de-obra.
De facto, num país em que uma parte significativa da população activa aufere salários inferiores a 1.000 €/mês, estar a actuar directa ou indirectamente (via redução efectiva e/ou via impostos) para diminuir os rendimentos das famílias parece-nos contraproducente, por mais justificáveis que sejam os argumentos da necessidade de reduzir custos para aumentar a competitividade.
De igual modo, a redução dos encargos que oneram os custos da mão-de-obra, designadamente os respeitantes à Segurança Social irá traduzir-se, a prazo, no agravar dessa problemática, já de si com sustentabilidade duvidosa.
Assim, uma opção seria o aumento das horas de trabalho para o mesmo salário, possibilitando a redução do seu custo por unidade produzida.
Várias alternativas podem existir para atingir este objectivo, algumas até a assumir a título definitivo e outras a considerar ainda que transitoriamente: eliminar alguns feriados e dias santos, eliminar tolerâncias de ponto, acabar com feriados municipais e, porque não, pelo menos enquanto a situação de dificuldade se mantiver, reduzir as férias anuais (para 4 semanas/ano) e aumentar o tempo de trabalho/dia em mais meia ou mesmo uma hora.
Naturalmente, é polémico aumentar o esforço de cada um para obtenção da retribuição necessária ao seu sustento e da sua família. Algumas das propostas significam mesmo, questionar o esforço e a luta de muitas gerações de trabalhadores para atingirem, por exemplo, a semana de 40 horas.
Os diagnósticos sobre as causas das dificuldades e as consequentes imputações de responsabilidades são aspectos a ter em conta. As opções sobre a distribuição do rendimento assim gerado são, igualmente, questões pertinentes. Não são, no entanto, o âmbito destes textos pois envolvem opções políticas que teremos todos, naturalmente, oportunidade de expressar a breve prazo.
2011.05.03
Carlos Rua

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Contabilidade – o que é e para que serve? (Continuação)

A contabilidade para ter utilidade, tem de se assumir como um instrumento de gestão indispensável para qualquer organização. Deve ser uma insubstituível fonte interna de informação para suportar a tomada de decisões, e não, o que é para uma grande parte das pequenas empresas, uma mera formalidade legal de custo elevado e cumprimento obrigatório. Qualquer empresário ganharia, em segurança e conhecimento do seu negócio, se soubesse ler e interpretar, ainda que sumariamente, as peças fundamentais da Contabilidade (designadas de Demonstrações Financeiras) e tivesse conhecimentos básicos do cálculo económico e financeiro. É neste ponto que os Técnicos Oficiais de Contas (TOC) podem e devem, também no seu próprio interesse, desempenhar um papel importante na qualificação técnica dos seus clientes.

A contabilidade regista diariamente aos “acontecimentos” do dia-a-dia, cuja leitura e interpretação abordaremos posteriormente. Anualmente, através dos mapas de síntese previstos no Sistema de Normalização Contabilística (SNC), podemos e devemos “ler” a situação da empresa, seja qual for a sua dimensão. Ora, passemos então a referir-nos à informação que podemos obter em cada uma daquelas peças contabilísticas:

· Balanço – “fotografia” da empresa, naquela data – Activo = Capital Próprio + Passivo. Esta expressão constitui o princípio básico da contabilidade, segundo o qual a aquisição do património da empresa (Activo) tem que ser financiada por capitais dos sócios (Capital Próprio) ou por capitais alheios (Passivo). Um outro aspecto fundamental é a relação entre Activo corrente e o Passivo corrente (num prazo inferior a um ano). Se o primeiro for superior ao segundo, a empresa evidencia capacidade para satisfazer os seus compromissos de curto prazo. Caso contrário, é provável que a empresa se veja forçada a recorrer a empréstimos para saldar as suas dívidas mais imediatas.

· Demonstração dos resultados – é um mapa dinâmico que evidencia como são gerados os resultados operacionais, após gastos de financiamento e de impostos do exercício e face ao ano anterior. Permite avaliar a posição económica ou de desempenho da empresa através da relação entre os rendimentos obtidos e os gastos incorridos, permitindo ajuizar acerca da eficácia com que a empresa emprega os seus recursos básicos e adicionais.

· Demonstração dos fluxos de caixa – apesar de não ser obrigatória para as empresas de reduzida dimensão, é um instrumento básico para percepcionar como os fluxos de caixa (entradas e saídas de dinheiro) fluem na empresa, por actividades: operacional, de investimento e de financiamento. Responde a questões de muitos empresários “Como é que tenho lucro e não tenho dinheiro”. Uma empresa pode ter lucro, ou seja, os seus rendimentos são superiores aos gastos, e não ter dinheiro porque o “desvia” das actividades operacionais para o investimento (situação muito comum), ou não recebe atempadamente dos seus clientes (ou vende mesmo a quem não paga (!) entregando, muitas vezes, o IVA antes de o ter recebido dos clientes) de forma a permitir cumprir com as suas obrigações (salários, fornecedores, impostos, empréstimos de bancos).

· Demonstração da alteração dos capitais próprios – mapa que também não é obrigatório para entidades de reduzida dimensão e que evidencia as modificações nos capitais próprios do exercício em relação ao anterior. Visualiza-se de forma imediata como foram produzidas essas alterações, ou seja, das opções de capitalizar ou descapitalizar a empresa.

· Anexo – elemento das demonstrações financeiras que “esclarece” muitos pontos dos mapas anteriores.

Qualquer um destes mapas permite a visualização das alterações do exercício actual com o anterior, incluindo o Anexo.

No próximo artigo continuaremos com a interpretação das opções que o órgão de gestão toma em relação às operações do dia-a-dia.

Isabel Martins

quinta-feira, 10 de março de 2011

Deveres de informação da banca e literacia financeira

Nos últimos tempos tem sido produzida muita legislação que obriga os bancos a proporcionar mais informação ao cliente bancário. Mas… quem a compreende de facto?

Legislação recente tem vindo a impor aos bancos a disponibilização, em papel e na Internet, de alguns documentos que pretendem dar aos clientes mais informação sobre produtos e serviços bancários. É o caso, por exemplo (mas não só), das “Fichas de Informação Normalizada” (FIN), quer para depósitos (Aviso nº 4/2009 do Banco de Portugal e respectivos anexos, I e II), quer para empréstimos (crédito à habitação: Aviso nº 2/2010 e Instrução nº 10/2010 do Banco de Portugal e respectivos anexos, I e II); crédito ao consumo: Instrução nº 8/2009 do Banco de Portugal e respectivos anexos, I, II, III, IV e V). Estes documentos contêm um conjunto de informações inquestionavelmente importantes. Produzi-los e mantê-los actualizados representa um custo acrescido para os bancos que, evidentemente, repercutem sobre os seus clientes. Mas qual é a sua real utilidade? Na minha opinião, não muita. Desde logo, porque poucos consumidores bancários os lêem; depois, porque destes, apenas uma parte os compreende. É o conhecido problema da enorme iliteracia financeira dos portugueses. De pouco adianta produzir excelente informação se ela for incompreensível para a maioria dos seus destinatários. O custo associado é real, o benefício duvidoso.

Em Portugal legisla-se demais (e nem sempre bem). Melhor aposta seria educar os cidadãos. No caso concreto da educação financeira, isso devia começar logo no ensino básico e atravessar todo o percurso escolar das crianças e jovens, até ao ensino superior. Aqui, deveria ser oferecida, pelo menos como opção, em todos os cursos. Não é exagero.

Na semana passada fiquei a saber que os exames feitos no âmbito do PISA (Programme for International Student Assessment), que avalia o desempenho escolar de jovens de 15 anos em 65 países em literacia de leitura, matemática e científica, vão passar a testar também os conhecimentos dos alunos em matérias de finanças pessoais. Isso acontecerá a partir de 2013, inicialmente em apenas 19 desses países. Portugal não fará parte deste grupo inicial.

Na sua página na Internet, a OCDE considera que “ajudar os mais novos a compreender as questões financeiras é importante”, uma vez que “têm maior probabilidade de vir a enfrentar maiores riscos financeiros na vida adulta do que os seus pais”. Aliás, há muito que a esta organização vem realçando a importância da promoção da literacia financeira, recomendando que ela deve ter início o mais cedo possível na vida dos jovens. Alguns países já o estão a fazer, como está bem patente no “Portal Internacional para a Educação Financeira” que a própria OCDE tem vindo a desenvolver e que testemunha inequivocamente a importância que está a ser dada a este assunto.

Entre nós, temos assistido nos últimos anos a algumas iniciativas, quase sempre voluntaristas, com vista à promoção da literacia financeira. No início deste ano, o Conselho Nacional de Supervisores Financeiros (Banco de Portugal, CMVM e Instituto de Seguros de Portugal) aprovou a proposta de um Plano Nacional de Formação Financeira que enviou ao Ministro de Estado e das Finanças. Vamos esperar pelos desenvolvimentos. Há dois anos a ASFAC - Associação de Instituições de Crédito Especializado propôs ao Ministério da Educação a criação de uma nova disciplina de educação financeira logo a partir do ensino básico e até agora, nada…

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Atenção às TAEG's!

A vivência de mais uma quadra natalícia e de “passagem” de ano, com certeza que deverá ter levado alguns de nós a não resistir à tentação de efectuar compras com recurso ao crédito. Pois bem, se foi esse o seu caso, atenção à TAEG (Taxa Anual de Encargos Efectiva Global) praticada!
Quais as razões de estarmos atentos?
O Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de Junho, determinou a fixação de taxas máximas que as instituições devem respeitar nos novos contratos de crédito por ele abrangidos, estando este regime de taxas máximas a vigorar desde o dia 1 de Janeiro de 2010. Este Decreto-Lei define, no seu artigo 28º, as taxas máximas como sendo as médias, acrescidas de um terço, das TAEG’s praticadas pelas instituições de crédito no trimestre anterior, nos diferentes tipos de contratos. Também, no âmbito do mesmo Decreto-Lei, foi atribuída ao Banco de Portugal a responsabilidade pela identificação dos tipos de contrato de crédito relevantes para a determinação das respectivas taxas máximas e a sua divulgação ao público, numa base trimestral.
Quais são os tipos de crédito relevantes e as respectivas TAEG’s máximas?
No quadro seguinte podemos encontrar toda essa informação, desde o momento da entrada em vigor deste regime até ao momento actual.
Taxas máximas aplicáveis aos contratos de crédito aos consumidores

Fonte: Portal do Cliente Bancário – http://clientebancario.bportugal.pt.
Estará este regime de taxas máximas a ser respeitado pelas instituições financeiras?
O Banco de Portugal, no âmbito da sua actividade de supervisão comportamental, analisou, de acordo com a Síntese Intercalar de Actividades de Supervisão Comportamental (publicada em 15 de Novembro de 2010, referente às actividades desenvolvidas no período de Janeiro a Agosto de 2010), 676 contratos de crédito com indícios de irregularidades, tendo chegado à conclusão que em 63 desses contratos, envolvendo 13 instituições financeiras, as TAEG’s tinham efectivamente ultrapassado as taxas máximas aplicáveis, de acordo com o Decreto-Lei n.º 133/2009.
Em suma…
Se contratou um crédito desta natureza nos últimos tempos, certifique-se de que a TAEG praticada não ultrapassa a TAEG máxima para o trimestre. Se for superior, faça a sua queixa no portal do cliente bancário (http://clientebancario.bportugal.pt), exija a aplicação da taxa máxima para o período e a devolução do que pagou em excesso.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Acta – o espelho da vontade da sociedade como pessoa colectiva

Na minha vida profissional e, no âmbito da legislação societária, tenho-me deparado com uma falta de conhecimento dos sócios quanto ao conteúdo quer material quer formal de uma acta.

Tenho visto, sem acreditar por vezes, que existem sócios que assinam actas sem sequer lerem o seu conteúdo, outros que assinam e descuram do seu registo público, outros que assinam sem serem sócios. Mas, afinal qual é o valor de uma acta?

Em primeiro lugar, convém esclarecer o que é uma acta. Ora, uma acta é um documento escrito que prova o modo como foi tomada uma deliberação social isto é, a vontade dos sócios manifestada em Assembleia-Geral. Trata-se, portanto, de uma finalidade “ad probationem” nos termos do artº63º do Código das Sociedades Comerciais.

Uma acta não deve conter apenas a deliberação, mas todas as ocorrências e circunstâncias em que foi tomada. A acta deve conter nomeadamente: a identificação da sociedade, o lugar, o dia e a hora da reunião; o nome do presidente e, se os houver, dos secretários; os nomes dos sócios presentes ou representados e o valor nominal das partes sociais, quotas ou acções de cada um, salvo nos casos em que a lei mande organizar lista de presenças, que deve ser anexada à acta; a ordem do dia constante de convocatória, salvo quando esta seja anexada à acta; referência dos documentos e relatórios submetidos à assembleia; o teor das deliberações tomadas; os resultados das votações e o sentido das declarações dos sócios, se estes o requererem.

Nas sociedades por quotas as actas devem ser assinadas por todos os sócios presentes. Quando um sócio se recuse a assinar a acta, a sociedade deve notifica-lo judicialmente para que a assine em prazo não inferior a 8 dias; decorrido esse prazo, a acta tem força probatória desde que esteja assinada pela maioria dos sócios. O sócio pode justificar a recusa da assinatura da acta com fundamento na sua falsidade ou desconformidade, mas se não houver fundamento poderá incorrer na sanção penal de multa até 120 dias.

Nas sociedades anónimas, as actas serão assinadas pelo Presidente da Mesa e, se os houver, pelos secretários, sendo que os accionistas apenas deverão rubricar uma lista de presenças que deve ficar anexada à acta.

Os sócios não devem esquecer que, em caso de violação da lei ou dos estatutos, as deliberações são inválidas, máxime inexistentes.

Com a predominância dos regimes de corporate governance, a Administração passou a ser o órgão principal, que detém os poderes efectivos na sociedade. Mesmo assim, ainda competem á Assembleia-Geral importantes poderes que, são ainda mais alargados nas sociedades de pessoas.

A acta reflecte desta forma o sentido de voto dos seus sócios/accionistas que deve ser livre, consciente e responsável em prol da sociedade.