terça-feira, 27 de maio de 2014

O défice de "capital intelectual"

Na sociedade da informação e do conhecimento em que vivemos, e sobretudo no mundo empresarial, o denominado “capital intelectual” assume uma importância fundamental. Grandes empresas como a “Apple”, a “Microsoft”, a “Sony”, entre outras, valem o que valem não pelos bens materiais e tangíveis (edifícios, terrenos, veículos, máquinas, etc.) que possuem, mas sobretudo pelos seus recursos humanos (altamente qualificados, responsáveis e motivados). Naturalmente que estas empresas implementam uma política de recursos humanos bastante cuidada, que se traduz não apenas na existência de critérios de recrutamento e seleção muito exigentes, mas também (e talvez sobretudo) numa ótica de preservação dos recursos humanos mais talentosos (evitando que possam sair para outras empresas, sobretudo para empresas concorrentes).
Na minha opinião, a importância que se deve dar aos recursos humanos deve estender-se também a uma perspetiva nacional, isto é, não é apenas uma empresa que se deve preocupar com a captação e retenção de bons recursos humanos, também um país que tenha ambições de desenvolvimento o deverá fazer (e note-se que desenvolvimento é bem diferente de crescimento!).
Nos tempos que correm, parece que os nossos governantes, tão preocupados que estiveram em fazer “boa figura” perante a troika, tão preocupados em tornar a garantir o financiamento do Estado português junto dos mercados financeiros, tão preocupados em diminuir o défice das contas públicas, estão a contribuir para um aumento substancial do défice de “capital intelectual” do nosso país, com consequências muito sérias não apenas no curto prazo, mas também a médio/largo prazo. Desde logo com a política de austeridade “cega” que está atualmente a ser aplicada, com a crise de confiança que os cidadãos em geral têm cada vez mais em relação às instituições nacionais, o nosso país não se afigura minimamente atrativo para “talentos” vindos de outros países. Além disso, apesar de Portugal ser desde há muito um país de emigrantes, as atuais características da emigração nada têm a ver com a emigração de anos anteriores (por exemplo dos anos 60 do século passado). Hoje em dia a emigração não é apenas feita com pessoas que vão para o estrangeiro trabalhar na construção civil, na restauração, em serviços de limpeza, na hotelaria, em explorações agrícolas. A emigração atual é também feita com enfermeiros, com engenheiros, com arquitetos, com professores, com investigadores, etc.. O nosso país está a formar profissionais (a maioria deles em universidades, institutos politécnicos e escolas públicas) para depois deixar que eles apliquem os seus conhecimentos e a sua formação no estrangeiro.
Em suma, será que ao estarmos tão preocupados em aproximarmo-nos em termos nominais (isto é, pelos “números e pelas estatísticas”) dos países desenvolvidos da União Europeia, não estaremos pelo contrário a afastarmo-nos deles em termos reais, perdendo um dos recursos mais valiosos que temos (os nossos recursos humanos)?!