Uma vez que estamos no início
de mais um ano escolar, decidi escrever sobre um tema que, apesar de não estar
diretamente relacionado com a questão da literacia financeira, me é familiar
por motivos pessoais: a “escola inclusiva”. Deste modo, o objetivo deste artigo
não é tanto deixar ensinamentos seja a quem for, mas apenas expressar a minha
modesta opinião sobre o assunto.
No nosso país, o documento
legal que regulamenta a educação especial é o Decreto-lei nº 3/2008, de 7 de
janeiro. No preâmbulo deste decreto-lei podemos ler que se deve “(…) planear um sistema de educação
flexível, pautado por uma política global integrada, que permita responder à
diversidade de características e necessidades de todos os alunos que implicam a
inclusão das crianças e jovens com necessidades educativas especiais no quadro
de uma política de qualidade orientada para o sucesso educativo de todos os
alunos”. De facto, estas palavras são muito bonitas… Pena é não saírem do
papel, já que a realidade do nosso país não tem nada a ver com o contexto
anteriormente referido!
Apesar da “bondade” do
decreto-lei que regulamenta a educação especial (defendendo aspetos muito
importantes como a elaboração de um programa educativo individual, a elaboração
de um plano individual de transição, a promoção de medidas educativas como o
apoio pedagógico personalizado, um currículo específico individual, tecnologias
de apoio, etc., com o intuito de promover a dita “escola inclusiva”), o que é facto
é que o verdadeiro sucesso escolar das crianças com necessidades educativas
especiais (digo verdadeiro porque, normalmente, independentemente dos
conhecimentos obtidos no final de cada ano letivo pelas crianças com este tipo
de necessidades educativas, elas transitam à mesma de ano), a promoção da sua
socialização e a sua integração na vida ativa continuam a ser extremamente
difíceis.
Apesar da existência de
medidas de apoio específicas para algumas crianças com necessidades educativas
especiais (é o caso, por exemplo, das salas de ensino estruturado para as
crianças com perturbação do espectro do autismo), na prática a implementação da
política da “escola inclusiva” passa pela integração da criança com
necessidades educativas especiais em salas de aula com crianças “normais”,
beneficiando periodicamente de aulas de apoio e, nos casos mais graves, sendo
destacada uma auxiliar de ação educativa (normalmente denominada de
“tarefeira”) para acompanhar a criança com deficiência. Quanto a mim, esta
prática é prejudicial para todos: desde logo para a criança com necessidades
educativas especiais que, na maioria dos casos, não aprende ao mesmo ritmo dos
colegas, podendo até ser alvo de alguma discriminação negativa; para os
professores, que por vezes não têm a formação necessária para lidar com casos
desta natureza (dada a potencial diversidade de casos); e para as restantes
crianças, que correm o risco de ver a sua aprendizagem decorrer num ritmo mais
lento que o normal.
Se
este cenário já não é o mais favorável por si só, então piora ainda mais quando
nos encontramos em conjunturas de crise económico-financeira como a atual.
Infelizmente, uma das áreas que também não escapou à política de austeridade
foi a educação especial. Não só diminuiu o número de professores afetos às
necessidades educativas especiais, como também a colocação de técnicos
especializados nas escolas (como é o caso, por exemplo, de terapeutas da fala)
continua a fazer-se de forma tardia. De facto é inadmissível que, após já ter
iniciado o ano escolar, apesar da lei (nomeadamente o decreto-lei que referi
anteriormente) obrigar a que as salas de ensino estruturado para crianças com
perturbação do espectro do autismo funcionem com uma terapeuta da fala, algumas
escolas (isto é, alguns agrupamentos de escolas) só agora tenham iniciado o
processo de colocação. Se não se registarem atrasos no processo do concurso,
talvez no final do mês de outubro estes técnicos já estejam a trabalhar nas
escolas… Será que a poupança de dinheiro proporcionada pelo não pagamento do
salário destes técnicos por um ou dois meses (meses de setembro e outubro)
justifica o atraso na aprendizagem e no desenvolvimento das crianças com
necessidades educativas especiais?! Bem, se calhar as crianças nem se queixam,
caso contrário não teriam necessidade de uma terapeuta da fala!!!