Este artigo, que é o último que assino no âmbito deste Projeto nascido há mais de seis anos (Clareza no Pensamento), foi espoletado por uma conversa que tive há dias com um amigo, empresário. Resumidamente, ele dizia que os jovens licenciados que recebe na sua empresa são “cada vez piores” (foi a expressão utilizada). “Não sei o que andam a fazer nas universidades, eles e vós” (ou seja, os alunos e os professores). As queixas do meu amigo assentavam, sobretudo, nos cada vez mais fracos conhecimentos técnicos revelados pelos licenciados. Não pude deixar de lhe manifestar a minha opinião.
Perguntei-lhe se achava possível, na sua empresa, manter a quantidade e, sobretudo, a qualidade do produto acabado se se visse obrigado a cumprir, cumulativamente e num curto espaço de tempo, as seguintes alterações (neste artigo, por razões de espaço, só vou referir duas, mas na conversa referi mais):
- Redução das horas de trabalho diárias (entenda-se: produção) para dois terços;
- Imposição legal, aos trabalhadores da produção, de cada vez mais tarefas burocráticas inúteis que os obrigassem a dedicar cada vez mais tempo do seu horário laboral à execução dessas tarefas não produtivas, com a agravante da dispersão mental que isso lhes acarretaria e consequente desfocagem do essencial das suas tarefas.
“Nem pensar!”, respondeu. “Certamente que tanto a quantidade como a qualidade do produto acabado diminuiriam”.
Perguntei-lhe se achava possível, na sua empresa, manter a quantidade e, sobretudo, a qualidade do produto acabado se se visse obrigado a cumprir, cumulativamente e num curto espaço de tempo, as seguintes alterações (neste artigo, por razões de espaço, só vou referir duas, mas na conversa referi mais):
- Redução das horas de trabalho diárias (entenda-se: produção) para dois terços;
- Imposição legal, aos trabalhadores da produção, de cada vez mais tarefas burocráticas inúteis que os obrigassem a dedicar cada vez mais tempo do seu horário laboral à execução dessas tarefas não produtivas, com a agravante da dispersão mental que isso lhes acarretaria e consequente desfocagem do essencial das suas tarefas.
“Nem pensar!”, respondeu. “Certamente que tanto a quantidade como a qualidade do produto acabado diminuiriam”.
“Pois bem, foi isso que aconteceu no ensino superior nos últimos anos”.
“Como assim?!” .
“Certamente não sabes, como não sabe a maioria das pessoas, mas o que se passa é isto:
- Uma licenciatura de hoje tem cerca de dois terços das horas de aula que tinha um bacharelato há alguns anos. Sim, um bacharelato. Já nem comparo com as licenciaturas “antigas”, de cinco anos. Tanto o bacharelato como a atual licenciatura tinham a duração de três anos. Porém, o plano de estudos de um curso de bacharelato tinha cerca de 2700 horas de aulas; o de uma licenciatura afim tem hoje, frequentemente, entre 1800 e 1900. Imagina que na tua empresa tinhas de passar de oito para pouco mais de cinco horas de produção por dia. Todos os dias. Se quisesses (ou fosses pressionado para) produzir a mesma quantidade de produto acabado, provavelmente terias de omitir algumas fases do processo produtivo, aligeirar outras, se calhar ser menos exigente no controlo da qualidade… enfim, terias quase certamente um produto final com menor qualidade;
- A isto acresce que a carga de trabalho puramente administrativo (burocrático) que hoje é imposta aos professores é de tal ordem que a sua disponibilidade material (tempo!) e mental para aquilo que deveria ser o essencial do exercício da sua profissão (preparação das aulas, materiais e estratégias, acompanhamento dos alunos, etc.) fica fortemente condicionado. Imagina o que seria se os teus funcionários da produção tivessem, obrigatoriamente, de preencher uma quantidade cada vez maior de papelada, assistir a cada vez mais reuniões e coisas afins que, de facto, não beneficiam em nada (pelo contrário) nem a quantidade nem a real qualidade do produto acabado.
Por isso, tenho muita dificuldade em concordar contigo.”
De facto, não concordo nada com quem acha que os alunos são maus, irresponsáveis, imaturos, enfim “cada vez piores”, e que a culpa é deles. Não acho que eles sejam culpados, mas sim vítimas. Vítimas de um conjunto de medidas que não criaram e, sobretudo, não controlam (nem eles, nem os professores, em rigor). Bem vistas as coisas, talvez os licenciados não sejam assim tão maus, dadas todas as condicionantes inerentes à atual “licenciatura” (e a todo o percurso académico que lhe está a montante). Muitos são até muito bons! E o mérito é sobretudo deles. De cada um deles. Com estas condicionantes (e outras, aqui não referidas), o êxito académico e profissional de um aluno e diplomado é cada vez mais mérito do próprio do que da instituição que frequentou ou dos professores que teve. Uma e outros têm cada vez menos tempo útil (e outros recursos) para isso.