Estará o ensino secundário a preparar jovens adultos para o exercício de aspectos básicos de cidadania?
Há dias tive conhecimento de um inquérito realizado em Setembro do ano passado na Universidade de Aveiro (UA) no âmbito do PmatE (Projecto Matemática Ensino) cujos resultados merecem alguma reflexão. Aos alunos que então ingressaram na UA e no ISCAA (Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Aveiro) foi solicitado que respondessem a algumas questões com vista a aferir dos seus conhecimentos financeiros (que podemos considerar de “básicos”). De todos os inquéritos recolhidos foram validados 345, o que é significativo. Destes, a maioria diziam respeito a alunos de Ciências e Engenharias (56%). Os restantes eram de alunos de Economia/Gestão/Contabilidade (19%), Humanísticas/Línguas (15%) e Saúde/Desporto/Artes (10%). Retive os resultados de três dessas questões:
1. Em qual das opções seguintes a água é mais barata (por litro)?
a. Garrafas de 0,25 litros a 0,40 euros
b. Garrafas de 0,33 litros a 0,50 euros
c. Garrafas de 0,50 litros a 0,70 euros
d. Garrafas de 1 litro a 1,50 euros
Percentagem de respostas erradas: cerca de 40%.
2. Queres comprar um casaco que está em promoção, marcado com o preço de 50 euros e um desconto de 20%. Quanto tens de pagar pelo casaco?
a. 40 euros
b. 30 euros
c. 49 euros
Percentagem de respostas erradas: cerca de 30%, sendo que os piores resultados foram obtidos pelos estudantes que ingressaram em Economia/Gestão/Contabilidade (cerca de 40% de respostas erradas).
3. Contraíste um empréstimo de 500 euros, por meio ano, à taxa de juro anual de 10%. Quanto pagaste no final do prazo (valor da dívida mais os juros)?
a. 525 euros
b. 500 euros
c. 550 euros
Percentagem de respostas erradas: cerca de 60%.
Sejamos honestos: devia ser expectável (diria mesmo, exigido) que qualquer aluno que tenha concluído o ensino secundário e ingressado no ensino superior respondesse correctamente a estas questões ou, enfim, pelo menos às duas primeiras. À terceira deveriam responder correctamente, pelo menos, os alunos que tivessem frequentado Ciências Socioeconómicas no secundário. Os alunos que responderam a este inquérito, na sua maioria, tiveram Matemática até ao 12º ano. Muitos deles realizaram com sucesso o respectivo exame nacional, após o 12º ano, o que torna ainda mais preocupantes os resultados. Serão eles representativos do que se passa a nível nacional? É impossível garanti-lo, mas não custa acreditar que sim. Que se passa, então, com o ensino secundário? Que programas estão a ser leccionados? Com que grau de exigência? Para proporcionar que competências a um jovem adulto? Estará a Escola (em sentido amplo) a prepará-lo para o exercício de aspectos básicos de cidadania como os retratados nas situações subjacentes àquelas questões? Não deveria ser esta uma prioridade da Escola?
1 comentário:
Lamentável, muito lamentável mesmo. É o que temos. Antes, os professores, para passarem de ano um aluno com boas notas tinham que o justificar, hoje não podem reprovar um aluno, se o fizerem tem que o justificar, … parece que a avaliação do professor depende do sucesso ou não dos seus alunos! Será?! Em minha opinião, existe um outro problema, há em Portugal ensino superior a mais. A concorrência entre as escolas de ensino superior é tremenda, para preencher os cursos tem que se aceitar tudo. Numa situação normal, alunos assim não entrariam no ensino superior.
Carlos Pereira
Enviar um comentário